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Câncer é uma doença metabólica? Dieta cetogênica?

Câncer é uma doença metabólica? Dieta cetogênica?

Ricardo S. Rosenfeld

Não é bem assim!

Imagine um mundo onde a cura para o câncer não está em tratamentos complexos e caros, mas em uma simples mudança na dieta. Essa é a promessa sedutora das dietas cetogênicas, um regime alimentar rico em gorduras e pobre em carboidratos, que tem ganhado popularidade como uma possível arma contra o câncer. No entanto, como um farol na névoa, a ciência lança um olhar crítico sobre essas alegações, separando a esperança do exagero.

A dieta cetogênica força o corpo a usar gordura como principal fonte de energia, produzindo corpos cetônicos. Essa mudança metabólica, teoricamente, poderia criar um ambiente desfavorável para as células cancerosas, que dependem principalmente da glicose para se proliferar. Estudos *in vitro* e em animais mostraram resultados promissores, sugerindo que a dieta cetogênica pode retardar o crescimento tumoral em alguns casos.

No entanto, a transição para estudos em humanos revela um cenário mais complexo e menos animador. A maioria dos estudos clínicos com dietas cetogênicas em pacientes com câncer são pequenos, não controlados e com resultados mistos. Alguns pacientes relatam melhora na qualidade de vida e estabilização da doença, enquanto outros não apresentam benefícios significativos e ainda sofrem efeitos colaterais como fadiga, náuseas e constipação.

É aqui que entra em cena o Dr. Thomas N. Seyfried (Professor de Biologia – Boston College), um defensor proeminente da teoria de que o câncer é, fundamentalmente, uma doença metabólica. Ele argumenta que as células cancerosas têm um metabolismo defeituoso, dependendo excessivamente da glicose para sobreviver. Segundo Seyfried, a dieta cetogênica, ao privar as células cancerosas de glicose, pode “matá-las de fome” e controlar o crescimento tumoral.

No entanto, essa visão simplista ignora a complexidade do câncer. O câncer não é uma única doença, mas um conjunto de mais de 200 doenças diferentes, cada uma com suas próprias características genéticas, moleculares e metabólicas. Nem todas as células cancerosas são igualmente dependentes de glicose, e algumas podem até se adaptar ao uso de corpos cetônicos como combustível.

Além disso, a ideia de que a dieta cetogênica pode “matar de fome” as células cancerosas é falaciosa. O corpo humano é um sistema complexo e resiliente, capaz de se adaptar a diferentes condições metabólicas. Mesmo em uma dieta cetogênica, o corpo ainda produz alguma glicose através da gliconeogênese, um processo que converte proteínas e gorduras em glicose. Além disso, as células cancerosas podem obter energia de outras fontes, como aminoácidos e ácidos graxos.

A alegação de que o câncer é uma doença primariamente metabólica, como defende o Dr. Seyfried, é uma simplificação perigosa que pode levar pacientes a abandonar tratamentos convencionais comprovados em favor de uma dieta restritiva e potencialmente prejudicial. A oncologia moderna reconhece a importância do metabolismo tumoral, mas também enfatiza o papel crucial de fatores genéticos, epigenéticos e imunológicos no desenvolvimento e progressão do câncer.

Em vez de abraçar a dieta cetogênica como uma cura milagrosa, os pacientes com câncer devem procurar orientação de profissionais de saúde qualificados, que possam avaliar seus casos individualmente e recomendar tratamentos baseados em evidências científicas sólidas. A dieta cetogênica pode ter um papel adjuvante em alguns casos, mas nunca deve substituir os tratamentos convencionais, como cirurgia, quimioterapia e radioterapia, que comprovadamente aumentam a sobrevida e melhoram a qualidade de vida dos pacientes com câncer.

Fontes

[1]  https://sciencebasedmedicine.org/ketogenic-diets-for-cancer-hype-versus-science/

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